Parque Nacional do Itatiaia: 6 mandamentos para subir o pico das Agulhas Negras


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Quando cheguei fiquei besta. O cenário de mato alto e seco, intercalado com pedras mais ou menos proeminentes e cercado por picos agudo de granito me relembrou da vastidão de ecossistemas que temos no Brasil. Da praia ao mangue, da caatinga à mata atlântica, das dunas dos Lençóis maranhenses aos cânions do Rio Grande do Sul. Mas é tanta coisa linda. Ora, como passei tantos anos da minha vida sem conhecer o Parque Nacional do Itatiaia?

Pico das Agulhas Negras

Pico das Agulhas Negras

Primeira reserva com esse status no País, criada em 1937, deveria ser também um dos primeiros lugares de contato das crianças com a natureza. Um excelente lugar para entender a complexidade da natureza no nosso território e a necessidade de preservação. Mais do que uma escola, praticamente uma universidade, de caminhada e escalada. Encravado entre Rio de Janeiro e Minas Gerais, concentra algumas da montanhas mais altas da Serra da Mantiqueira.

Vista geral Camping, refeitório e banheiros. Pico das Agulhas Negras ao fundo

Em meio a um cenário sem igual no Brasil, o Parque Nacional do Itatiaia oferece uma boa infraestrutura para iniciados e iniciantes em montanhismo e caminhada. Além de ótimos guias – obrigatórios para caminhadas longas – oferece uma única área de camping, com banheiros e chuveiros. Um dos únicos do tipo no país, o Abrigo Rebouças, localizado a 2.350 metros de altitude, tem 20 camas e é uma alternativa para quem não quiser ou não puder acampar.

Abrigo Rebouças oferece camas aos visitantes

É preciso reservar pelo site ou no e-mail [email protected], o pernoite custa R$ 30 no abrigo ou R$ 18 no camping, além dos R$ 16 de entrada no parque para brasileiros residentes – dá para alcançar o Abrigo Rebouças de carro, após pagar as taxas. Caso não durma no alto do parque, há pousadas na parte baixa, perto da cidade de Itatiaia, mas tenha em mente que é preciso chegar muito cedo na portaria do parque – pois há limites de visitantes por dia em cada pico. Caso não tenha um guia no grupo, é preciso contratar por cerca R$ 100 por grupo – há uma lista no site e clique em “Condutores de Visitantes”.

O Itatiaia ostenta alguns dos picos mais clássicos de trekking e 3 das 10 montanhas mais altas do Brasil. Não são mais autorizados acampamentos selvagens nem travessias de vários dias dentro dos 120 quilômetros quadrados do parque. Entre as duas mais célebres montanhas, o Pico das Prateleiras e o Pico das Agulhas Negras, com 2.790 metros de altitude. Estive por lá em junho e subi o segundo ao longo de um dia todo. Como eu acho que essa caminhada é inesquecível e muito rica de aprendizado, compartilho aqui 6 mandamentos subir as Agulhas Negras.

1) Entender do que se trata

Se você nunca fez uma caminhada na vida, não comece a descobrir o Itatiaia pelo Pico das Agulhas Negras. No parque há trilhas mais simples como Cachoeira do Aiuruoca e Pedra do Altar, com menor grau de exigência física e emocional.

Vai pra onde?

O Pico das Agulhas Negras é um maciço de granito com trecho muito íngremes, onde se usa muito as mãos (a chamada “escalaminhada”), mas não é necessário ter técnicas de escalada ou experiência anterior em rocha. É tudo bem instintivo e os guias são essenciais no processo. Não recomendado para quem sofre de vertigem. Por muitas vezes fica-se diante de quedas livres que podem significar ferimentos graves e até morte. Não é exagero. Por isso é bem importante estar bem mentalmente. Fisicamente é uma jornada de alta intensidade, que costuma levar algo entre 6 e 9 horas, saindo e retornando até o Abrigo Rebouças. Considere estes fatores antes de optar por esta montanha.

2) Utilizar equipamentos adequados

Não vá de qualquer jeito. Seu equipamento é crucial para ditar a experiência que terá na montanha. Use um calçado com o qual esteja muito acostumado a caminhar – lembre-se, caminhada é uma atividade física diferente de corrida. Recomendo bota de caminhada de cano alto LACEADA. Pelo amor dos seus filhinhos, não vá estrear calçado na montanha. Além das bolhas certeiras, você pode comprometer o grupo todo a ter de diminuir o ritmo ou desistir do programa. Calçado novo se estreia com usos curtos em meio à rotina – indo ao trabalho, caminhadas breves na cidade, etc.

Primeiros passos em meio aos campos de altitude do Parque Nacional Itatiaia

Primeiros passos em meio aos campos de altitude

Numa boa mochila de ataque – até 30 litros – de preferência com barrigueira, leve filtro solar, chapéu, câmera ou celular e um casaco corta-vento. Não se deixe enganar por dias ensolarados, quando o vento entra, machuca a pele e pode provocar hipotermia.

3) Caminhar sempre com um guia

Há uma carência proposital de sinalização não apenas para que se contrate um profissional, como para evitar sumiços no parque. Enfim, uma coisa evita a outra.

FOTO6_A emblemática ponte pênsil

A emblemática ponte pênsil.

Atenção: DÁ PARA SE PERDER FACILMENTE NO PARQUE. Isso fica óbvio quando você se afasta do grupo por alguns minutos. Além disso, há momentos de breves escaladas com cordas em que a ajuda de guias faz toda a diferença. A trilha conduz a pontos em que é preciso subir pedras com auxílio de cordas e cadeirinha de escalada – sim, usa-se as mãos. Não são paredes verticais, mas faz diferença ter ou não equipamento.

A coisa começa a ficar séria…

… bem séria!

São trechos de risco em que erros podem custar caríssimo. Os guias do parque relataram apenas uma vez em que um resgate foi feito de helicóptero nos últimos anos. Ou seja, você pode ter de caminhar quilômetros com torção ou fratura.

4) Começar cedo

O Parque fica a 2h30 da Cidade do Rio de Janeiro ou a 3 horas de São Paulo pela Via Dutra. Dali saia no km 318, em Engenheiro Passos, 12 km depois de Itatiaia. Depois siga pela BR-354 Rio-Caxambu por 26 km, até a Garganta do Registro. Dali até a entrada da parta alta do parque, o Posto Marcão (ou Posto 3) são 14 quilômetros em estrada de terra. Depois, mais 3 quilômetros sobre pedras em péssimas condições até o camping e o Abrigo Rebouças – claro que dá pra ir caminhando, mas conte aí mais 6 quilômetros no total percorrido.

Subida ao pico das agulhas negras

Você não vai querer perder nem por um minuto a oportunidade de ver paisagens como essa.

Se parar o carro neste ultimo estacionamento, serão “apenas” 5 quilômetros de caminhada, mas estamos falando de um percurso que leva, tranquilamente 5 horas para ir e voltar. É super técnico e vertical. Como o parque nacional abre cedo (7 horas), vale madrugar mesmo, não apenas para se garantir no grupo máximo de pessoas por dia mas para retornar do pico ainda com o dia claro.

5) Ritmo de montanha

Respeite seu corpo. Andar devagar é a lei na montanha. Ao sair cedo você terá tempo de ir e voltar em segurança, andando constantemente e num ritmo leve.

Parque Nacional Itatiaia

Não só séria, a coisa também começa a ficar LINDA!

Os campos de altitude são uma vegetação complexa e repleta de pedras soltas, onde é fácil tropeçar e torcer o pé. Além disso, poupar energia é tudo na montanha.

Como é bom ver alguém lá no cume. Você chega lá. Respeite seu tempo.

Apesar de não ser uma Cordilheira dos Andes, na Bolívia ou no Peru, a Serra da Mantiqueira oferece picos com mais de 2 mil metros e é possível sentir os efeitos da altitude e o ar rarefeito já nesse ponto. Por isso, vai de leve.

6) Seu corpo, uma regra

Cuidar bem dele. Não há carro que possa ir te buscar na trilha, tudo dependerá de você. É importante manter-se saudável e inteiro. Comer bem e regularmente ao longo de todo o dia. Faça paradas de hora em hora ou quando se sentir cansado. Tenha pelo menos dois sanduíches fartos para saborear e repor as energias. Leve muitas comidinhas para ir comendo nas paradas, como nozes, castanhas, frutas secas e barras de cereal. Até mesmo frutas secas, como maças e bananas são ótimas, e estas últimas evitam cãibras.

Enfim, chegamos!

No final o esforço compensa. Quem chega no cume, além da vista, ainda tem direito de assinar o caderno. A descida é igualmente bonita. O difícil vai ser ir embora, e se despedir do parque na linda luz do final do dia.

Voltando pra casa

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  • Ingrid Coelho Martins

    Olá Felipe, Que bonita descrição! Gostei muito da sensibilidade, em especial com os próprios limites, com o corpo…

    Gostaria de fazer uma breve observação: Não é obrigatório a presença de um condutor, mas sim de alguém que conheça o caminho e mostre na entrada os equipamentos de escalada necessários. O valor dos condutores varia, mas é sempre mais alto do que o citado no texto!

    • Felipe Mortara

      Oi Ingrid, muito obrigado pelos elogios e pelo seu comentário.

      Não é obrigatório, claro, mas é muito recomendada a presença do condutor. É fácil se perder, especialmente nos trechos de ascensão mais contundentes/
      Quanto aos valores, vou averiguar.
      Muito obrigado,
      Um abraço

  • Olá.. Vc recomenda algum guia ou o local onde posso encontrar bons guias? Obg!

    • Felipe Mortara

      Oi Ivo, acabei indo sem guia oficial, com um amigo conhecedor do parque. Na portaria, pelo telefone (24) 3352-1292 você pode achar um guia bacana para te ajudar. Um abraço

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