O que fazer com as férias em caso de furacão ou terremoto?


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Quando crianças, se passamos um bom tempo sem ver algum tio ou tia é normal escutarmos: “nossa, como você está diferente!”. Com as viagens ano a ano fui percebendo e aceitando que não são apenas as pessoas que mudam. Os lugares também mudam e muitas das memórias que guardamos de vários destinos se reconfiguram a cada vez que voltamos para lá. Seja por alguns hotéis, restaurantes ou museus novos. Ou então pelo fim de todos eles.

Na semana passada quatro outros eventos naturais vieram se somar ao Furacão Harvey, que havia provocado muita destruição no Texas e na Louisiana. Os furacões Irma, José e Katia, depois rebaixados à categoria de tempestades tropicais, bagunçaram a vida e causaram mortes e prejuízos materiais no Caribe e no Golfo do México. Como se não bastasse esse monte de desgraça, o potentíssimo terremoto de 8,2 graus na escala Richter (que vai até 9 graus) destruiu algumas das regiões mais bacanas do México.

Tudo isso somado ao fato de eu estar escrevendo esse post no dia 11 de setembro de 2017 – portanto 16 anos depois do fatídico atentado aos Estados Unidos – me lembram apenas que os destinos que visitamos mudam. Nossa vida segue imersa em relatórios, rotina, transporte público apertado e trânsito, e o mundo muda o tempo todo. E isso está totalmente fora do nosso controle.

Mas o que fazer se o seu destino de férias está entre os afetados?

Depende. Se pretende ir nos próximos três meses para alguma das regiões do Caribe leste – o mais atingido pelo Irma – é bom mudar os planos. Outras partes do Caribe, como Cancun, San Andrés, Curaçau e Aruba, estão fora da rota dos furacões e seguem sendo bons destinos no curto e médio prazo. Miami e a Flórida ainda devem sofrer bons desgastes, mas por estarem num país desenvolvido se recuperaram logo e em breve (creio que antes de dezembro) já devem estar bem preparados para receber todos em segurança.

 

Hotel Eden Rock em St. Barthelémy foi arrasado pelo Irma

Se estiver com férias marcadas na região, Ricardo Freire, do Viaje na Viagem, resumiu quase tudo aqui nesse post que eu recomendo bastante.

O México ainda corre risco de réplicas nos próximos dias, mas não é porque algum lugar é zona sísmica que você vai deixar de visitar. Eu não deixaria. A área afetada pelo tremor de 7 de setembro, principalmente a região de San Cristobal de Las Casas, em Chiapas, e o Estado de Oaxaca, estão entre os mais preciosos lugares do país.

Aliás, boa parte dos destinos mais cobiçados do mundo fica em zonas sujeitas a tremores: Itália, Grécia, Califórnia, Peru, Chile, etc… a lista é vasta. E o turismo continua bombando nesses países.

Miami Beach

Por que continuar visitando países “de risco”

“Ah, nunca mais vou ir lá porque o lugar já não é mais o que era antes”. Esse é o pensamento mais perigoso e perverso que um visitante em potencial pode ter. O turismo é reconstrução e cada turista é um tijolinho. Parece um baita clichê cafona, mas cada dólar que você levar para o destino é um pouco de confiança extra que você estará dando a quem, de fato, precisa pôr grana na reconstrução. Seja um governo ou, como é o caso na maioria das vezes, das famílias e empresários que perderam tudo.

Algo muito importante de ter em consideração é que o visitante pode até não encontrar um lugar como já viu antes ou como estava anunciado nas fotos de promoção turística. Mas ele será agente da transformação, ele será motivador, ele será impulsionador de um novo processo.

O que acontece depois?

Há menos de um ano estive em St. Barthélemy, vizinha de St. Martin, ambas destruídas pelo furacão Irma. Em janeiro de 2016 estive em Miami, também na rota do fenômeno. Um ano antes estive no México e me apaixonei por Oaxaca e Chiapas. Três anos atrás estive no Nepal, um ano antes do terremoto que mudou até o Monte Everest de lugar. E 19 atrás subi nas Torres Gêmeas, em Nova York. Em comum, esses cinco lugares são queridos na minha memória. E mudaram. Ou sumiram.

Cidade histórica de Bakhtapur, devastada pelo terremoto de 2015 no Nepal

Mas preciso aceitar que não são e não serão mais como lembro deles. Na real, talvez essa seja até uma forma de proteger lembranças queridas caso eu volte lá. É possível que alguns lugares se recuperem e que a precisão da reconstrução ou a beleza dos novos edifícios supere o que era. Mas é bom aceitar que, em ambos os casos, o lugar mudou.

Só que é importante ter em conta que nós também mudamos o tempo todo. Quando as notícias vão chegando você tem uma baita dificuldade de visualizar os lugares arrasados. Afinal, você dormiu ali, brincou ali, aprendeu e deu risada, naquelas praias, naquelas praças. A gente deixa um pouco da gente nos lugares e pega muito em troca. Essa barganha é muito desproporcional: o mundo nos dá muito mais do que deixamos para ele. Por isso viajar alimenta tanto a alma.

Como posso ajudar no médio e longo prazo?

Não tenha medo e não espalhe o medo. Sua rotina numa grande cidade brasileira te brinda com inúmeros momentos MUITO mais perigosos e estatisticamente mais arriscados do que ser vítima de um furacão ou terremoto. Siga viajando.

Continue com seus planos de viagem e cheque apenas se as condições mínimas de segurança e saúde de um determinado destino estão valendo. Uma amiga seguiu para o México logo após o tremor. E fez bem, pois à curta distância as notícias são mais frescas e é possível ajudar diretamente.

Catedral de Oaxaca, no México

Inclusive, lembro sempre de um menino da escola que tem até hoje meu carinho e respeito eterno por ter mobilizado suas férias para ir ajudar vítimas do tsunami de 2004 na Ásia. Mudar o foco das férias de “pés para o ar” para “mãos na massa” pode ser uma opção para os mais intrépidos.

Pensei que uma coisa bacana de fazer nesse momento é ir lá no Trip Advisor (ou mesmo no Google Maps) e recuperar as memórias dos destinos afetados – e deixar sua avaliação, não deixar eles caírem no esquecimento, por mais famoso que seja o lugar. Entrar na página de cada estabelecimento bacana em que estive, um restaurante no México, um hotel em St. Barths, um bar em Miami, e colocar uma avaliação. Não como forma apenas de dar uma força para os proprietários que terão de reconstruir tudo, mas como estímulo para que todos os que estiveram lá e os que têm qualquer pretensão de ir acreditem que aqueles lugares foram, são e voltarão a ser incríveis.

Me lembro de amigos me perguntando se deveriam ir ao Nepal mesmo após o terremoto de 2015. Estavam preocupados de não ver alguns templos de 800 anos de pés. Em ver miséria e destruição. Claro que ninguém quer ver isso e “gastar” as férias numa “cilada” dessas não parece ser a melhor opção como repouso anual. Mas o grande lance é que aceitar que os lugares mudam e que seu olhar transformador pode fazer parte dessa mudança é o melhor cenário para todas as partes.

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